quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

E se eu fosse eu?


O título deste texto não é meu, embora gostaria que fosse. Faz parte do texto do espetáculo Prazer, da companhia de teatro Luna Lunera, aqui de Belo Horizonte. Ultrapassando os limites do clichê, esta foi uma peça em que todos os elementos possíveis conspiravam para que eu não assistisse. Dor de cabeça, chuva, congestionamentos inexplicáveis e uma série de outros fatores me levavam contra o convite de uma grande amiga, mas fui. E tive a sensação de que  estava justamente onde deveria estar.

Prazer conta a história de quatro amigos que se reencontram em algum lugar do estrangeiro após anos de distância. Entre bebidas, sorrisos, presentes e histórias, eles começam a questionar os rumos que suas vidas tomaram e, de uma forma extremamente bem amarrada, o texto coloca o espectador em xeque o tempo todo. Entre eles está o título desta crônica: e se eu fosse eu? O que faria? 

Pela primeira vez em muito tempo ouvi uma pergunta que me deixou sem resposta nem palpite. Não sei. Desde a consciência da minha existência tenho sido exemplo, seguido regras e feito tudo como manda o script. Mas quem escreveu esse texto? Quem ditou o que eu deveria ter feito até aqui? Quem limitou a minha participação no mundo a uma trajetória prevista, óbvia, estática? Eu que não fui.

Se eu fosse eu, seria alguém mais livre de convenções e seria educado apenas por reciprocidade. "Legal comigo, legal contigo". Se eu fosse eu não descansaria enquanto não encontrasse um ofício que me desse realmente prazer para que trabalhar parecesse hobby e eu conseguisse total prazer nisso. Se eu fosse eu, saberia que a hora de começar é a hora que eu sinto vontade - mesmo não estando preparado -, e que a hora de parar é a hora que eu achar que não vale mais a pena persistir. 

Se eu fosse eu, de verdade, não teria metade dos amigos que tenho, pois seria necessário o dobro de paciência para me aguentar. Se eu fosse eu, moraria em Roma, Praga, Curitiba ou Dubai e seria extremamente feliz por estar ao invés de pertencer, pois esta é uma verdade quase que incontestável. Se eu fosse eu, amaria sem limites e declararia meus sentimentos sem medo de rejeição ou vergonha do escândalo.

Mas eu não sou eu, você não é você, e por mais desprendido das convenções que possamos ser, ainda seguimos o script da rebeldia, pois até quem vai contra a maré ruma para algum sentido. Esta é a nossa condição, o que não significa que não podemos às vezes sair um pouco do roteiro, criar nossa própria história e compor o personagem "eu" de forma primorosa, como escritor nenhum faria. 

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