quinta-feira, 11 de setembro de 2014

O TEMPO QUE FOI PERDIDO



“Veja o sol dessa manhã tão cinza”, dizia Renato Russo. Pois nem o céu claro, provocado por uma das mais longas estiagens da história do nosso país, conseguiu fazer com que esta manhã de quinta feira fosse menos cinza. Isso porque hoje fomos bombardeados com mais uma notícia de um assassinado provocado por homofobia, desta vez no estado de Goiás. As tempestades que chegarão de agora em diante jamais serão da cor dos olhos castanhos de João Antônio, um jovem de apenas 18 anos que teve a vida ceifada por um motivo tão torpe: o de ser quem é.

E de pensar que, tempos atrás, éramos tão jovens. Mas essa juventude nos foi roubada e hoje somos reféns. Reféns dos nossos representantes, que insistem em fechar os olhos diante de estatísticas tão alarmantes. Reféns da mídia, que nos transmite apenas o que é de seu interesse. Reféns do sistema, onde ainda prevalece a lei da selva. E também refém de uma cultura arcaica e opressiva, onde tudo o que é considerado fora do normal, é descartado, às vezes da pior forma. Mas o que é normal?

Vivemos num país conhecido mundialmente pela cordialidade e alegria. Somos ensinados a sermos cordiais com as visitas, mas como farei isso se sou incapaz de tratar bem aos meus semelhantes? Quando é que fomos ensinados a derramar sangues amargos e sermos selvagens?

Em períodos eleitorais, uma das bandeiras mais levantadas é a da Educação e isso é pauta de todo candidato. Mas o que foi prometido, ninguém prometeu. Confundem sistema ensino com educação e se esquecem que isso é coisa que se aprende em casa. Não sabem a diferença entre física, que é uma matéria, com respeito à integridade física, que é disciplina. Empurram a responsabilidade para o professor, às vezes sem saber que cada pai é também um educador.


João Antônio já não tinha mais o tempo que passou e agora também não tem todo o tempo do mundo. Hoje muita gente não vai mais lembrar e esquecer como foi o dia. Sua família e seus amigos ficarão algum tempo sem seguir sempre em frente. Perderam o tempo. Tempo de estar com João, tempo de amar João, tempo de valorizar João. Não tenho medo do escuro, mas deixem as luzes acesas para que possamos ver no que se transformou a nossa Geração Coca Cola.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Aeroportos


Há lugares que te fazem sentir bem, outros podem te causam melancolia, mas há lugares em que você experimenta da euforia ao completo desalento ao mesmo tempo. O teatro é um exemplo de lugar onde você experimenta das mais diversas sensações. Já saí de peças com câimbras intensas na barriga de tanto rir, mas também já saí aos prantos, feito um panda com olheiras profundas. Mas por mais que a arte nos comova de forma reflexiva, a gente se expressa mesmo quando o drama é com a gente mesmo e, se há um lugar onde as emoções vêm à tona, este lugar é o aeroporto.

Se você é como eu, que gosta de observar a alegria e o drama alheio, te aconselho a passar uma ou duas horas num aeroporto. Basta um pequeno espaço de tempo e você verá como as pessoas se despem das máscaras e agem por instinto. Tem o executivo apressado que consegue ser doce ao telefone com um cliente e um ogro com os funcionários da companhia aérea. Tem a madame que desce do salto e apronta barraco porque extraviaram sua mala. Tem o famoso que arreganha um sorriso em frente às câmeras, mas usa chapéu, casaco e óculos escuros, orando a Deus para não ser reconhecido por fãs. É tanta verdade que te assusta.

Mas meus lugares favoritos são o embarque e o desembarque de passageiros, principalmente dos vôos internacionais. Em ambos há choro, mas a diferença é sutil fica do lado esquerdo do peito. As lágrimas caem no embarque porque o coração está do tamanho de uma ervilha, e como isso dói. Já no desembarque é um acúmulo de lágrimas que foi represada na ausência e agora as comportas já não retém de tanta saudade e até o mais bruto dos homens vira criança e abre o berreiro.

Que tal imaginar que o mundo é um grande aeroporto? E se a gente pudesse ser a gente mesmo, sem máscaras, sem pose, sem fingir algo que não é pra quem a gente nem conhece? Te assusta a ideia de ser quem você é? Já pensou que legal seria se pudéssemos, fora de aeroportos, dar longos abraços em nossos amigos e familiares e dizermos o quanto os amamos? Já parou pra pensar que aeroportos só nos emocionam pela consciência de que é possível, sim, que as pessoas que amamos podem não estar ao nosso lado para sempre?


Então viva como se a vida fosse um grande saguão de aeroporto com chegadas e partidas, ora temporárias, ora permanentes. Grite, chore, dance, ria, pule, corra e, acima de tudo, esteja em movimento. Pois aeroportos podem ter de tudo, menos emoções vazias.