segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

O FIM E O COMEÇO SÃO SEMELHANTES

Vez em sempre me surpreendo como pequenas coisas podem me causar tanta tormenta. Pequenos gestos com grandes significados, pequenas frases com tanto o que dizer, pequenos silêncios que dizem mais que tantos livros. A última da vez foi uma frase atribuída a Jorge Bohaczuk, que diz: “O fim e o começo são semelhantes”. Ela vinha acompanhada de uma imagem que mostrava uma senhora bem idosa e uma criança de meses de idade, ambos apoiados em um andador.

O fim e o começo são semelhantes. O óbvio passa a ser tão comum e a gente nem percebe. Àqueles que é dada uma vida longa percebem isso com mais clareza. A pele fina, a falta dos dentes, a notável dificuldade de andar ou se equilibrar, a dependência de outros para fazer as coisas simples que um adulto realiza no modo automático. E sempre um impaciente para criticar as “artes” como se fossem intencionais, por crueldade. Origem e destino nunca foram tão próximos.

O fim e o começo são semelhantes. Quem viveu mais de um relacionamento amoroso pode ter visto isso sem perceber. Os silêncios são longos, as palavras faltam, a sensação de que algo vai mudar nossas vidas muito em breve e aquela vontade de dizer o que sente só aguardando uma ocasião oportuna. Em ambos o passado não importa, o presente parece nunca ter fim e tudo o que se quer é chegar logo num futuro. Com ou sem o outro. Guardadas as devidas proporções, são bem parecidos.

O fim e o começo são semelhantes. Você começa um trabalho sem saber se vai dar conta do serviço e, quando quer sair, às vezes tem a mesma dúvida. O período de experiência, o aviso prévio. Perguntas como “por quê você quer trabalhar nesta empresa?” mudam de sentido quando, em vez de trabalhar, a palavra da vez é “sair”. Erros bobos por desconhecimento. Erros bobos por descontentamento. Papeladas, burocracias e uma vontade de evoluir. Neste caso, também são semelhantes.


O fim e o começo são semelhantes. Mas é que a gente está tão anestesiado de informações, rotinas e agendas durante os meios, que a gente só para pra pensar nos começos e nos fins. E essa cegueira é mesmo uma injustiça, pois a graça da coisa está justamente onde não percebemos. Fins e começos são bem semelhantes, mas não iguais e nem sempre conseguimos enxergar que estamos numa montanha russa: altos, baixos, loopings, e a única certeza que temos é que, quase sempre, a porta de saída está ao lado da de entrada.  

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

É TEMPO DE...

Até os 10 a gente aprende. Experimenta, explora, questiona e se conecta ao lugar onde a gente nasceu. E este lugar nada tem a ver com localização, mas com o nosso lugar no mundo. Quem sou eu? Quem são essas pessoas que sempre estão comigo? Qual é o sabor disso? E se eu pular daqui? E é aí que conhecemos o limite, a mínima noção do que posso e do que não posso.

Até os 20 a gente culpa. Culpa os hormônios que mudam nosso corpo de uma forma que a gente não pediu. Culpa nossos pais que não entendem as nossas necessidades e nos privam de muitas coisas que os pais dos nossos amigos permitem. Culpa as espinhas, a falta de liberdade, as pressões do vestibular e do mercado de trabalho. A gente se culpa pelo primeiro amor que não deu certo, pelo primeiro porre, pela primeira briga de amor, pelas primeiras dívidas.

Até os 30 a gente se estabelece. É tempo de estreitar os laços feitos que ainda existem e criar outros que podem perdurar pelo resto de nossas vidas. A gente se descobre profissionalmente, adquire maturidade e serenidade para se posicionar em praticamente todas as áreas de nossas vidas: pessoal, profissional, familiar, amorosa e agora também a espiritual. Embora a cobrança seja ainda maior que na adolescência a gente tem a consciência dos nossos objetivos e que as expectativas que os outros criam sobre a gente é de responsabilidade somente deles – e eles que lidem com isso. A gente ainda culpa, mas culpa os dias que ficam mais curtos perto de tanta coisa a fazer.

Ainda estou longe dos 40 e não ouso prever como será o caminho até lá, mas me atrevo a acreditar que seja a fase que a gente se perdoa. Já não há mais lugar para culpas em nossos pensamentos e, quando ela surge, são enfrentadas de forma bem racionais. Faz o melhor que pode com o que tem e, com o que não tem, entende que não há o que fazer. Dúvidas vão surgir durante toda a vida, mas a essa altura a gente já se conhece o suficiente para encarar de frente.


Claro que tudo que escrevi até agora são minhas verdades e cada um que crie e viva a sua. É que num momento em que tantos que com idade próximas a minha estão buscando se conhecer, se culpar ou se estabelecer, hoje eu só quero me perdoar. Te perdoar. Nos perdoar. Porque sem perdão só o que resta é peso e não nasci pra afundar.